Já me têm perguntado porque tão frequentemente escrevo de forma deveras negra.
Faço-o porque essa escuridão habita em mim, qual pássaro em gaiola.
Se não a liberto, o grito da ave toma conta dos meus pensamentos e não me deixa ouvir os sons do meu restante eu.
Solto toda esta escuridão, para que ela não me devore, e para me permitir manter a clareza de raciocínio, o sorriso e a minha (pseudo)serenidade.
Escrever negruras não é algo que deva apoquentar. Preocupante é quando elas ficam silenciosas, devoradoras, afogando-me em pessimismos maiores que a realidade.
Escrever negruras é curar.
A solidão, combato-a com um bom livro, uma quente companhia ou um suave vinho tinto; Ao negrume respondo com o calor de palavras negras depositadas sobre o fundo branco de uma página vazia.
Dispo-me de mim, enquanto tento interiorizar que o que está em jogo não sou eu.
Procuro libertar-me de movimentos egotistas, de maneira a manter a acção mais relevante que o actor.
Surpreendo-me, frequentemente, ao longo do dia em longas e silenciosas discussões internas, numa procura por um desprendimento que me não é fácil atingir.
Não me apetece ser, de novo, essencialmente funcional. Este desprendimento nada tem com isso.
Apenas procuro dar prioridade ao outro, num momento em que pouco sai de mim para mim.
Numa fuga a um ego, cujo presente se encontra longe do que se sonhou.
Por vezes pergunto-me o porquê de tanta discrição, porque manter o íntimo recatado.
Por vezes apetece-me expôr de forma quase devassa a intimidade das minhas dores.
As lágrimas que foram secando, não deram fruto, não deram alívio.
Se a gritar desaparece? Se a declamar amortece?
Sinto que quando o grito se cala, morde pela calada.
Mas mantê-lo íntimo, permite gerir a dor, a saudade, a tristeza, ou o que quer que isto seja.
Torno-me funcional durante o dia e trabalho a dor durantes as longas noites. Em silêncio.
No recato dos meus sonhos dou a liberdade aos sentimentos, manejando com cuidado as ingerências da insónia que acaba por surgir.
Quando cansada de lutar, deito a cabeça sobre a doçura da almofada, afogo(-me) (n)as lágrimas, e aninho-me no embalar das minhas ilusões, reinventando coragens para a manhã que se aproxima.
E deixo ficar na intimidade de cada dia, a dor que me assalta no escuro da noite.
Há já vários dias que sinto o ímpeto de vir até aqui escrever um pouco, mas de cada vez que olho para a página vazia (ou melhor, para o ecrã em branco) pareço não encontrar o que dizer.
Sinto ter perdido a direcção das minhas palavras, o destino de parte dos meus pensares.
Estes têm sido tempos de decisões e a maioria destas não está totalmente nas minhas mãos, embora sejam do meu interesse.
A espera parece dar cabo das palavras por dizer, deixando-me um pouco mais orfã da capacidade de expressão.
Aguardo mensagens, reuniões, confirmações de esperanças ou medos, mas que me permitam redifinir metas, caminhos, desejos, ilusões.
Até lá, as páginas em branco vão-me atormentando, numa necessidade íntima de expor o que me vai na alma e na incerteza do que é que quero dizer ao certo.