A tua voz
O dia esteve quente, hoje.
O calor não ajudou a pouca concentração com que estava no trabalho e acabei por aceitar o desafio de ir almoçar a um dos meus lugares preferidos. Inevitavelmente sobre o mar.
Pensei que seria a forma certa de recuperar a atenção.
O mar, o indescritível cheiro a maresia, a frescura de um rosé, a boa conversa, tudo isso me ajudou a recuperar tranquilidade.
Voltei à mesa de trabalho revigorada, pronta a atacar os inevitáveis relatórios desta época do ano. Ao lado destes, um conjunto de cadernos com ideias à espera do tempo para as desenvolver.
Valeu a pena.
Mas agora veio a noite.
E embora o cansaço seja evidente, o calor não me ajuda a adormecer.
Dou comigo deitada, a aplicação com a sessão de indução do sono ligada, e eu a olhar para a escuridão do quarto.
Tudo serve para agitar o sonho desperto, que me não deixa adormecer.
A voz na aplicação vai falando e eu penso em ti.
Como seria ouvir a tua voz agora? Que me dirias? Embalarias o meu sono?
Mudo de posição e a voz da aplicação.
A noite continua quente. O corpo teima em não arrefecer.
A mente insiste: e a tua voz? Que me diria?
Se te pedisse apenas uma palavra, qual terias para me oferecer?
Eu já tenho uma para ti.
A rua lá fora vai-se aquietando. Não há vento esta noite. Apenas calor e o som do comboio ao longe.
E a tua voz imaginada a escolher palavras que me fazem adormecer.