Abandono
Como é que me pudeste deixar?
Partir sem regresso, como se te tivesses esquecido das nossas promessas.
Tinhamos os planos feitos.
Companheiras de aventuras desde a minha infância (cheguei ao mundo depois de ti),
era suposto termos envelhecido juntas.
Lembras-te?
Iamos ser duas velhotas a viver num espaço simpático. Casas térreas, porta com porta.
De manhã iriamos beber um café e rir e falar das mil e uma tolices que só duas irmãs conseguem falar.
Das cusquices da família. Inventar histórias, como tanto gostávamos de fazer.
E rir. Sempre rimos tanto!
Os teus filhos iriam visitar-nos, e trariam os seus filhos.
De tarde, irias para a tua sala de pintura, enquanto eu iria para minha casa ler os meus livros - nunca os conseguirei ler todos, sabes?
E agora?
Com quem me vou rir?
Como é que vou envelhecer?
Deixaste-me para trás; nem lutaste.
E eu? Eu aqui fico perdida, à espera de saber, um dia, lidar com este abandono.